Calculando o futuro da Amazônia

Por Pedro Lira

O xis da questão pode estar nas partes mais desmatadas

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Com a escalada do desmatamento na Amazônia –segundo o INPE, ele cresceu 34% em um ano–, os períodos de seca na região, além de mais intensos, estão mais longos. Estudos recentes apontam que um terço da umidade da Amazônia provém da floresta e, desse total, mais da metade é oriunda da transpiração das árvores. A situação cada vez mais preocupante impele os cientistas a investigar até que ponto a floresta consegue suportar a seca.

A matemática Marina Hirota, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), utiliza uma abordagem inovadora para encontrar os limites de sobrevivência das mais de 40 mil espécies de árvores espalhadas pelo bioma. Valendo-se de modelos matemáticos, ela aposta na heterogeneidade dos ecossistemas para prever o futuro da Amazônia.

Considerando variáveis específicas, seu grupo busca avaliar a resistência da floresta a períodos prolongados de seca. O sistema atual mede a velocidade de superação da planta –depois da seca, de quanto tempo ela necessita para se reerguer? “Nós vamos fazer diferente”, ela destaca. Ou seja: os pesquisadores vão estimar até quando a planta fica de pé antes de sucumbir.

Os cientistas elaboraram um projeto que parte das plantas para entender como o clima ameaça a vegetação. Ao contrário do método de downscaling –que parte do clima para entender seu impacto na floresta–, tradicionalmente usado na ecologia, o upscaling faz um caminho em outra direção e analisa em quais condições de escassez de chuvas a floresta pode colapsar. Hirota esclarece: “Pegamos uma comunidade altamente estudada, ou seja, recortes de 10m x 30m da floresta, e por meio de um modelo matemático tentamos reproduzi-la para a bacia toda” –que tem mais de 5 milhões de quilômetros quadrados.

Mas com os incêndios e desmatamentos batendo recordes, por que apostar na seca? Hirota explica que este mediador é apenas o primeiro passo no vasto estudo de resiliência. “Com as adaptações necessárias das variáveis, essa ferramenta que estamos criando pode ser usada para prever outros impactos florestais, como os incêndios.”

Para a professora, as consequências das queimadas, seca e desmatamento são incontestáveis, embora seu resultado na floresta talvez não seja tão óbvio como possa parecer ao leigo. “Pensando na bacia inteira, a Amazônia é muito grande e heterogênea, não dá para dizer se ela vai se transformar numa enorme savana. Acho uma conclusão incerta, sobretudo se considerarmos as respostas de diferentes regiões da Amazônia a mudanças”, ela diz. “Mesmo que a floresta chegue a seu extremo, essas regiões ainda poderão sustentar uma floresta, ainda que de um tipo diferente da que conhecemos hoje.”

Hirota acredita que as áreas mais desmatadas –nas regiões leste, nordeste e sudeste da floresta– podem guardar o futuro da Amazônia. “Queremos testar a hipótese de que essas regiões, as menos estudadas e em geral os maiores alvos de desmatamento, influenciam diretamente na resiliência do bioma como um todo.”

Se sua hipótese se provar certa, nossos olhos deveriam estar voltados para essas partes mais desmatadas do território, e não para as regiões ainda virgens. A pesquisadora explica que, cortando-se uma árvore no sul da Amazônia, por exemplo, o sudeste da floresta também sofre, já que as regiões estão conectadas pelo fluxo de umidade e o sistema natural do amortecimento dos períodos de seca do bioma. “Tentamos dizer para quem implementa políticas de preservação que esses são lugares que precisam ser estudados. O conhecimento dessas plantas vai nos ajudar a prever o que vai acontecer com a Amazônia no futuro.”

Para investigar um ecossistema tão diverso, a equipe não poderia ser diferente. No grupo, quase integralmente brasileiro, matemáticos, físicos e economistas com um pé na biologia se uniram para pensar soluções para a maior floresta tropical do mundo –sempre em diálogo com os saberes tradicionais e comunidades locais. “Essa diversidade de ideias ajuda na abordagem de baixo para cima que usamos, o upscaling. Tem sido uma experiência maravilhosamente desafiadora”, conclui Hirota.

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Pedro Lira é jornalista e social media no Instituto Serrapilheira

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