Quantas pedras há na orla de Copacabana?

Por Edgard Pimentel

Talvez seja isso que Drummond, sentado perto do forte, esteja tentando responder

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A praia de Copacabana se mistura à história da matemática: foi lá que Stephen Smale vislumbrou uma certa ferradura muito especial. É lá também que o olhar de Carlos Drummond de Andrade, sentado perto do forte, perde-se ao longe. Com todo o tempo do mundo disponível, será que ele estaria tentando quantificar o verso e responder, afinal, quantas pedras há no meio do caminho?

O calçadão da orla de Copacabana se estende por 4 quilômetros, cobertos por um desenho feito de pedras brancas e pretas que acabou virando um cartão-postal da cidade. Quantas pedras há no calçadão de Copacabana? Como podemos contar quantas pedras há nessa orla?

A primeira estratégia para resolver o problema é contar uma por uma. Mas seus inconvenientes são óbvios: a temperatura pode não ser a mais amena e sempre há o risco de se distrair com a beleza do entorno. Sem contar que requer uma paciência de Jó.

Tentemos outro método. Suponha que a largura do calçadão seja de 4 metros. E vamos supor que ele tem a forma de um retângulo. Assim, sua área seria de 16 mil metros quadrados. Já que no calçadão cabem 16 mil quadrados de 1 metro cada lado, vamos nos concentrar em um deles. Para simplificar, vamos chamar estes quadrados menores de unitários.

A ideia é simples: se soubermos quantas pedras há em um quadrado unitário, basta multiplicar a resposta por 16 mil e teremos uma estimativa para o calçadão inteiro. Aqui, o exercício se reduziu a contar quantas pedras há em uma área (bem) menor.

Vamos fazer uma estimativa sem sair de casa. Suponha que cada pedra seja perfeitamente quadrada, com lados de 5 centímetros. Assim, haveria 400 delas em cada quadrado unitário. E no calçadão inteiro haveria algo como 6,4 milhões de pedrinhas. Mas tem um detalhe crucial: a conta só funciona se todas as pedras tiverem o mesmo formato e as mesmas medidas. Uma hipótese muito forte, talvez.

Uma alternativa é atribuir probabilidades às formas e tamanhos das pedras. Um metro quadrado corresponde a 10 mil centímetros quadrados. A ideia é cobrir 10 mil centímetros quadrados com pedras de 25, 16, e 9 centímetros quadrados, e um ‘resto’. Vamos supor que 20% das pedras sejam as de 25 centímetros quadrados, 40% delas sejam as de 16 centímetros quadrados e outros 20% sejam as de 9 centímetros quadrados.

Este cenário requer 80 pedras de 25 centímetros quadrados (pra cobrir 2 mil dos 10 mil centímetros quadrados), 250 pedras de 16 centímetros quadrados e 222 pedras de 9 centímetros quadrados. O total já está em 552 pedras e ainda faltam 2 mil centímetros quadrados a serem cobertos. Estes 2 mil centímetros quadrados da nossa ignorância são cobertos por pedras de vários tamanhos, e pelo rejunte entre elas (por melhor que seja o mestre calceteiro, sempre há lá qualquer coisa). Digamos que existam aqui outras 150 pedras, elevando o total para 702. O total do calçadão passa a 11 milhões e 232 mil pedras!

Fazer variar a ocorrência de cada formato de pedra trará resultados diferentes. Mas qualquer ocorrência suposta a priori pode implicar erros gigantescos. Afinal estamos a multiplicar o que não sabemos por números como 16 mil!

Vamos tentar algo empírico –vamos pra rua! Ao caminhar pela orla, podemos nos deter, delimitar 1 metro quadrado e contar quantas pedras há nele. Após 500 metros, repetimos o experimento. Ao final do calçadão, teremos oito amostras. Podemos calcular a média e multiplicar por 16 mil. Pelas minhas contas, teríamos 8 milhões e 128 mil pedras. Uma vez mais, há problemas: se uma reforma recente alterou o padrão da calçada, os dados podem produzir erros.

Outra estratégia envolve ter à mão um computador e pedir ajuda à inteligência artificial. O plano é ensinar a máquina a contar pedras a partir de uma foto de alta resolução. Com um drone, sobrevoamos o calçadão e tiramos diversas fotografias. Alimentamos o computador com tais imagens e perguntamos a ele quantas pedras há. Claro que uma sombra fora de lugar ou um passarinho podem produzir distorções na análise. E o custo computacional pode ser elevadíssimo. Mas talvez não seja má ideia.

Uma resposta definitiva parece impossível. E talvez irresponsável. Mas refletir sobre uma questão assim é como caminhar na orla: independentemente de onde se chega, o caminho é o que mais importa.

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Edgard Pimentel é matemático e professor da PUC-Rio.

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