O tempo incomoda

Ilustração: Linoca Souza
Ciência Fundamental

Por Sarah Azoubel e Bia Guimarães

E parece que está mais debochado do que nunca

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Depois de quase um ano pesquisando sobre vírus, mosquitos e doenças para a série “Epidemia”, lançada em parceria com a Folha em março deste ano, nós nos vimos empacadas com a decisão sobre qual caminho seguir na temporada seguinte do 37 Graus, podcast em que buscamos decifrar o mundo à nossa volta. Como falar de ciência sem tratar diretamente da pandemia? Que outro assunto pode ser tão relevante neste ano tão estranho? E, acima de tudo: que histórias podemos contar sem sair de casa?

Foi então que começamos a falar sobre o tempo. Por um lado, é como se estivéssemos vivendo o mesmo dia de novo e de novo, as horas e semanas se fundindo numa massa amorfa. Por outro, sentimos que já passou uma década de março para cá.

Essa bagunça de calendários e relógios só fez crescer nossa curiosidade e nosso incômodo, porque pensar no tempo não é nada confortável. Tente. Qual é a cara do tempo? Quanto tempo você ainda tem? Como estará o mundo daqui a cem anos? E daqui a mil? Por que o passado às vezes parece tão misterioso quanto o futuro?

Decidimos mergulhar nesse desconforto na nova temporada. De quebra, acabamos achando a solução para um de nossos atuais problemas: se não podemos viajar por aí, nada nos impede de viajar no tempo.

Ao fazer do tempo o centro da nossa atenção, descobrimos histórias de cidades, pessoas, animais e ideias que o desafiaram ou foram desafiados por ele. Na ciência, encontramos grandes perguntas que habitam o território movediço entre o que já sabemos, o que ainda não sabemos e o que parece ser mesmo indecifrável.

O próprio conceito de tempo passou por revoluções. Até o começo do século 20, a física o tratava como algo absoluto e uniforme, independentemente de quem o medisse. Albert Einstein, com suas teorias da relatividade, sacudiu esses pilares ao propor que o tempo poderia passar mais rápido ou mais devagar, a depender da velocidade de quem o medisse ou de onde esse relógio se encontrasse no universo, já que ele –na verdade, o espaço-tempo– estaria sujeito a deformações.

Parte da teoria de Einstein só foi comprovada graças ao céu de Sobral, no Ceará, em certa manhã de maio de 1919. Por dois motivos distintos (que você pode descobrir no podcast), essa foi a cidade que fez o tempo virar. E nós queríamos transportar nossos ouvintes para lá, para assistir aos cinco minutos que mudaram tudo.

Na jornada para entender o tempo, também chegamos às investigações sobre como o percebemos. Para nós, ele se manifesta como uma linha que nos empurra em direção ao futuro, mas o cérebro humano tem a incrível capacidade de viajar nessa linha. Sem sair do lugar, visitamos memórias e fazemos projeções para o futuro. Será que somos os únicos animais com essa capacidade? Até que ponto conseguimos de fato imaginar o futuro e tomar decisões pensando no amanhã?

Em busca dessas respostas, nós nos infiltramos na cabeça dos macacos e depois fomos parar num cofre que guarda um pedaço do futuro, num cenário que mais parece ficção científica do que realidade.

Nesta temporada, não saímos de casa munidas de gravadores como normalmente faríamos. Mas fomos do átomo ao telescópio, dos neurônios ao palco de uma ópera, da serra da Capivara à Noruega, do fóssil à imortalidade. Com sorte, os ouvintes que têm nos acompanhado nos últimos meses puderam se sentir transportados para outros tempos e espaços neste momento bizarro.

Como já esperávamos, em vez de se encerrar com respostas, a viagem chegou ao fim com ainda mais perguntas. Afinal, estamos falando do tempo. Não dá para esperar dele respostas absolutas. Saímos com a sensação de que ele é, de certo modo, indecifrável. E esse talvez seja o seu grande charme. Se fosse um personagem, o tempo com certeza debocharia das tentativas da humanidade de entendê-lo.

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Sarah Azoubel e Bia Guimarães são as criadoras do podcast 37 Graus, que pode ser ouvido em qualquer aplicativo de podcast ou no site do programa.

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