Os supersensores e a experiência de um cientista baiano na África do Sul

Ilustração: Valentina Fraiz
Ciência Fundamental

Por Jeferson Batista

Igor Miranda quer tornar o tal do futuro tecnológico mais humano

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Baiano de Salvador, Igor Dantas Miranda nasceu e cresceu em Nordeste de Amaralina, bairro popular e populoso da cidade. Com pai engenheiro e mãe matemática, desde criança foi estimulado a desenvolver habilidades aritméticas, cercado de revistas, jogos e brinquedos. Na adolescência, aprendeu sozinho a programar computador. Seu ingresso no curso de engenheira elétrica, na Universidade Federal da Bahia (UFBA), foi uma extensão natural desse percurso.

É na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, onde hoje leciona em cursos de engenharia elétrica e de computação, que o professor compartilha com colegas e alunos seu interesse por um futuro ainda mais tecnológico. Ele investiga modelos matemáticos para processar dados gerados por supersensores  –equipamentos criados a partir de uma combinação de sensores menores e que pretendem mudar, ainda mais, a experiência humana com a tecnologia.

Antes disso, Miranda acumulou no currículo mestrado e doutorado em engenharia na UFBA, pós-doutorado na sul-africana Universidade de Stellenbosch, passagens por instituições de pesquisa e desenvolvimento, além de publicações em revistas internacionais. Aos 37 anos, é casado com a pesquisadora da área de zootecnia Rosani Matoso, com quem tem uma filha de três anos. Ele faz questão de incentivá-la precocemente a seguir o caminho da ciência, do mesmo modo que foi incentivado por seu pai.

Mas, voltando aos supersensores: medicina, educação e segurança são apenas algumas das áreas que vão se beneficiar dessas ferramentas. “A ideia é desenvolver equipamentos com capacidade de observação aumentada, mas com dimensões e custos reduzidos, ou seja, supersensores minimalistas: mais potentes e, ao mesmo tempo, mais simples”, explica o cientista.

O tal futuro tecnológico só fará sentido se for acessível, mais humano e menos nocivo à sociedade, ele sustenta. Assim, em seu doutorado o cientista investigou um sistema de detecção e localização de disparo de armas de fogo, dentro da área de sensores de som. Partindo de uma tecnologia com um preço elevado, decidiu fazer uma versão mais barata.

Com base em sua pesquisa, Miranda oferece modos de identificar as origens dos tiros e, consequentemente, mapear os focos de violência urbana, que, como lembra, afeta sobretudo a população negra. “Entendi que tornar a tecnologia mais acessível é a motivação da minha vida. E é importante que esse desenvolvimento tecnológico avançado seja feito em todas as regiões e por grupos racialmente diversos”.

O pós-doutorado na África do Sul foi promissor. Lá, o pesquisador atuou com uma experiente equipe da área de engenharia aplicada à medicina e inteligência artificial, focada em monitorar pacientes de tuberculose por meio do som da tosse. Agora, em parceria com colegas sul-africanos, ele está investigando como o nível de saturação e a frequência respiratória podem ser parâmetros importantes para estabelecer o estágio da Covid-19 no organismo.

Miranda, que segue a linha Ketu do candomblé, lembra, com um sorriso, da experiência de conhecer pessoas do grupo étnico-linguístico iorubá  –idioma que estuda– ao longo de sua estada em território africano. Foi uma vivência de “conexão com a ancestralidade” e “uma ferramenta para compreender sua realidade local”.

Para o professor, a ciência brasileira, em especial a nordestina, tem vários pontos em comum com a ciência feita em países africanos, como a criatividade, muitas vezes movida pela falta de recursos, e o foco em melhorar a vida das pessoas.

Ao lado da mulher e de outros cientistas, Miranda fundou o Instituto Mancala em prol da diversidade racial e com o objetivo de promover pesquisa desde uma perspectiva negra e indígena. “Só assim teremos chance de dar certo enquanto sociedade e evitar os erros do passado e do presente”, ele pondera.

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Jeferson Batista é jornalista.

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